segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Entrevista a Pedro Jardim, autor de "O Monstro de Monsanto"

Pedro Jardim nasceu em Lisboa, em 1976, e foi no Alentejo, em Vila Viçosa, onde viveu desde muito novo, que descobriu o prazer pelas artes e pela literatura. Fez o liceu na Princesa do Alentejo, berço da poetisa Florbela Espanca, e licenciou-se em Sociologia, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. É chefe de Polícia desde 2006, depois do ingresso na PSP em 1998. Além das funções que exerce, detém também experiência em investigação criminal, com curso de especialização em 2003. A paixão pela literatura fez com que aprofundasse os seus conhecimentos e levou-o a estudar escrita criativa com João Tordo. Vencedor do prémio Mais Literatura 2013, pela revista Mais Alentejo, publicou a sua primeira obra, As Crónicas do Avô Chico, em 2011 e A Senhora da Tapada, no ano seguinte. Conta com inúmeras participações em antologias de poesia e livros de contos. Ser pai levou-o a apaixonar-se pela literatura infanto-juvenil, área que tem já dois títulos editados: O Dragão Rouxinol e Gigante Gigantão, de 2013 e 2014. Com um e outro, tem visitado livrarias, bibliotecas e escolas por todo o país. O Monstro de Monsanto é o seu primeiro romance.


O Marcas de Leitura esteve à conversa com Pedro Jardim autor de "O Monstro de Monsanto".

1) Como começou a sua paixão pelos livros?

R: Olá a todos! Em primeiro lugar, queria agradecer a amabilidade ao blog Marcas de Leitura a realização desta pequena entrevista. E respondendo à sua primeira questão posso dizer que: livros… Esta é a parte em que tenho de fazer uma confissão; quando era novo não gostava muito de ler. Escrevia, sim; transportava tudo para o papel, também. Mas ler, não lia muito, tirando livros de banda desenhada. Não lia, de facto, o que os outros escreviam. E depois, do nada, e ainda bem que assim foi, de repente, senti uma necessidade enorme de conhecer mais, de aprender mais ainda, de ver o que não podia ver, de entrar em outros mundos, aquela sensação de ser transportado para outro lugar. E foi então que se plantou em mim a paixão pela literatura. É por isso que, apesar do pouco tempo que tenho disponível, não passo sem ler.

2) Quando e como surgiu o gosto pela escrita?

R: Só recentemente mergulhei no plano de escrever com o fim de editar. A paixão pela escrita, essa, nasceu quando era muito novo, em Vila Viçosa, berço da poetisa Florbela Espanca. Tudo me movia a escrever: os meus sentimentos, o calor do Alentejo, as cores quentes, os meus avós, as aventuras que experienciei na minha infância. Depois fui crescendo e esse amor cresceu comigo. Engraçado! Por curiosidade, ainda me lembro quando escrevia cartas de amor. Escrevia sobretudo prosa poética e pensamentos soltos, despegados.

3) Faz da escrita a sua profissão ou não?

R: Não sou escritor de profissão, sou escritor por paixão. Sou chefe de Polícia, formado em Sociologia. A escrita tem um lugar transversal em toda a minha vida e nestes últimos tempos tem sido difícil conjugar as duas coisas, a literatura e a minha profissão. Escrever tem vindo a tornar-se num assunto muito sério. E como trabalho por turnos, é complicado gerir a minha agenda, sobretudo devido às minhas visitas a estabelecimentos de ensino, públicos e privados, com as minhas obras de literatura para infância, sendo a última o Gigante Gigantão.

4) De onde surgem os seus personagens, imaginação ou realidade?

R: Depende do assunto, do público alvo, da história. Bem! Se vissem a lista de coisas que temos de pensar/idealizar quando escrevemos uma história, pelo menos num projecto profundo, consciente e reflectido. Nem queiram saber! Daqui a pouco já desenrolo a lista completa; preparem-se, vai ser longa. Não basta ter uma imaginação fértil. Considero ser a parte mais fácil. A minha inspiração assemelha-se por vezes a uma fonte que está sempre a jorrar água. Mas há que lhe deitar mão e não deixar que se perca de alguma forma. Claro! Sempre com as ferramentas certas e os caminhos mais acertados: a questão da moral escondida, das personagens, sua caracterização, tempo físico e emocional, como contar, ritmo, etc. Quando parto do ponto zero, por assim dizer, penso em muita coisa, imagino ainda mais e inspiro-me em tudo, no real e no irreal. Imaginem uma nova fórmula de ver as coisas, o de virar o mundo de pernas para o ar, ou vê-lo através do microscópio. É bem diferente, não é? Não tenho um local preferido onde escrever, não tenho uma musa, uma ninfa do Tejo, como Camões, não! Pego no teclado do computador e ele não escreve, não digita, ele transfere, isso sim, o que penso, imagino e crio.

5) Dos livros que já escreveu, qual a sua personagem favorita?

R: Aqui vou responder face ao género infantil. A minha personagem favorita é o Dragão Rouxinol. É a primeira personagem que saltou do papel para um livro deste género, tão bem ilustrado pela minha querida amiga e talentosa Raquel Pinheiro. E a miudagem adora-o.

6) Qual o livro mais marcante que já leu até hoje?
R: Tenho alguns que me marcaram, cada um pela sua forma de sentir. Mas aquele que li “de fio a pavio” foi: As palavras que nunca te direi, do Nicolas Sparks.

7) Já alguma vez se deparou com alguém a ler um livro escrito por si? Se sim, como se sentiu?

R: Por acaso não. Mas se acontecesse perguntava: aconselha-me a comprar esse livro? E sentir-me-ia nas nuvens, claro!

8) Qual a sensação, ao deslocar-se a uma superfície comercial, e ver os seus livros à venda?

R: Nem sempre podemos dizer que, sim, temos os nossos livros nas livrarias. Depende muito dos editors e da sua forma de encarar o livro enquanto objecto e negócio. Eu tenho edições em que isso acontece. Os autores que passam por este tipo de percurso, sabem do que falo. Mas felizmente, considero-me um privilegiado e posso dizer que já vejo livros meus nas livrarias e grandes superficies, como é o caso do meu primeiro romance que lancei agora, O Monstro de Monsanto. E é muito bom, muito bom mesmo, vê-lo em todas as livrarias do país. É um grande orgulho!

9) Quando está a escrever um livro partilha a história com alguém para se aconselhar?
R: Como escrevo vários géneros – poesia, infantil, crónicas, romance – tenho algumas (poucas) “cobaias” para me ler. Não escondo o que escrevo, pelo menos às pessoas mais chegadas. Os meus maiores confidentes são a minha mulher e o meu filho, cada um em seu género diferente. Mas trabalho também com uma revisora profissional, a Cristina Silveira de Carvalho, uma grande amiga, que me aconselha também.

10) Qual o seu autor preferido?

R: Tenho muitos, mas o mais parecido comigo, ou eu com ele (é mais isso!), é o Fernando Pessoa. Sem dúvida! Também tenho muitos Pedros dentro de mim.

11) Segue o género literário do seu autor preferido, ou adopta outro?
R: Não sigo o género em livros editados de minha autoria. Mas escrevo poesia, sim, apesar de apostar na crónica, infanto-juvenil e romance. Tenho também alguns poemas espalhados em algumas antologias poéticas em que participei, aqui e ali.

12) Quando termina de escrever um livro, qual a sensação?

R: A primeira coisa que penso é: ai!, vem aí a revisão. Escrever um livro é fácil, esculpi-lo é mais difícil. Terminar um livro é como sentir que nos acabou de nascer um filho. É realmente isso, a analogia ao nascimento de algo, no fundo de nós próprios, que escrevemos. Depois sai-nos dos braços e deixa de ser nosso e passa a ser de toda a gente.

13) Como vê o momento actual da literatura em Portugal?

R: Vou responder a esta questão, levando para aquilo que eu sinto enquanto autor face à dificuldade que nós (novos autores) sentimos quando queremos editar os nossos livros. Vou responder sem rodeios, a pergunta assim o merece e quem sabe possa esclarecer alguém que deseje editar. Não se assustem, mas é mesmo assim: é fácil editar livros em Portugal, desde que se paguem as edições (ponto). Ser-se autor nestas condições é simples, basta ter-se disponibilidade financeira, pesquisar no Google as dezenas, ou centenas, de editoras que existem no nosso país, ou, quem sabe, estrangeiras, como é o caso brasileiro, e procurar quem queira editar. Agora ter uma editora que nos abrace, na ascensão da palavra, não é nada fácil, até para os autores, ditos, conhecidos da praça. Hoje em dia, com a conjectura actual de recessão, é muito difícil ser-se escritor em Portugal; as editoras, dos maiores grupos, estão a fechar as portas a muita gente. Mesmo assim, não me posso queixar. E não se preocupem, o cenário não é assim tão negro. Têm é de batalhar o dobro, lutar muito mesmo, ler e estudar (fundamental) e procurar as oportunidades nos tempos certos.

14) Quer deixar alguma mensagem especial aos seguidores do blog Marcas de Leitura?

R: Vou deixar uma mensagem para aqueles que um dia sonham vir a ser escritor, que desejam que o seu trabalho seja editado. Não é fácil ser escrevente ou ambicionar vir a ser escritor. É muito difícil e tem de se lutar muito para se ter alguma visibilidade e ter uma obra que não seja apenas mais uma, que de certa forma marque algum tipo de diferença. Hoje em dia há muitas ferramentas, muitos cursos, que há uns anos não existiam. Eu tenho apostado na formação em escrita criativa; é uma mais-valia quando queremos fazer uma coisa mais séria. Todos nós podemos ter imaginação, inspiração, contudo temos de possuir as tais ferramentas de que falava – para não deixar entornar a água da fonte da inspiração. Porque o talento pode existir, mas se não for moldado, lapidado, nunca deixará de ser apenas um diamante em bruto. É esse o meu conselho, apostem na vossa formação e tentem editar livros com editoras que se preocupem de facto com os autores e que os ajudem a dar os primeiros passos no mundo literário. Se o fizerem, façam-no para marcar diferença, senão correm o risco de serem mais um. E agora sim, a minha mensagem especial para todos vocês: nunca desistam dos vossos sonhos, são eles que nos mantém vivos. “Os sonhos não se ganham, conquistam-se.” Obrigado.

Para já fico-me por aqui e agradeço desde já a sua disponibilidade e simpatia
Muito obrigada Pedro, desejo-te os maiores sucessos!





5 comentários:

  1. Gostei muito! Grande entrevista :)
    Identifico-me com imensas coisas que o Pedro Jardim disse porque também passei e passo por situações que ele referiu na publicação dos livros. Além disso, é sempre bom ver quem escreve por paixão. Estou curioso para ler o "O Monstro de Monsanto", eu que sou um amante (e escritor) de policiais!
    Abraço e força.
    Bruno Franco

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  2. Muito obrigado, Bruno!
    Espero pelo teu feed back.
    Abraço.
    Pedro Jardim

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